quarta-feira, 14 de abril de 2010

O Caso Morel

Resenha enviada pela nossa amada Kika. Leu o livro e pensou na gente. Se você também quiser enviar qualquer coisa (resenha, reflexão, ensaio sensual, dinheiro...) pra Sociedade Dionisíaca, entre em contato pelo e-mail sociedadedionisiaca@gmail.com.

O caso Morel seria mais um livro que, de primeira, talvez não atraísse o olhar até dos mais atentos leitores. Só lendo este pequeno livro de Rubem Fonseca escrito na década de 70 para entender o porquê de ele merecer alguns comentários.


O livro fala de um artista, Paul Morel, que se encontra encarcerado por ter matado uma companheira. Dentro da prisão, ele resolve escrever um livro com um conteúdo autobiográfico. O grande barato do livro nem é o enredo, mas como esse é composto.

Paul Morel, durante a vida, dedicou boa parte do tempo a fazer sexo com todas as mulheres que lhe atraíssem sem o menor constrangimento. Algumas, aliás, casadas e pertencentes a uma classe elevada. Um tapa na cara da moral que envolve a questão de família. Há trechos em que se descrevem cenas sexuais com direto a termos nada consagrados pela literatura mais puritana, como também a algumas perversões – a exemplo disso, ocorre uma festa em que os convidados realizavam uma verdadeira orgia.

Aliás, Morel, ao longo do livro, resolve fazer a própria família, uma família diferente composta por ele, três mulheres com as quais teve relações sexuais em algum momento e o filho de uma delas. “(...) uma família diferente, que não existe ainda, onde todos os integrantes são livres, em que os laços não são os de proteção, mas os de amor.”

Paul Morel, mesmo depois de ter sido casado durante dez anos com uma mulher de quem não conseguia se separar porque a considerava sua “propriedade privada”, resolveu formar essa família mais por experiência e amor à liberdade do que por vontade de manter pessoas juntas a ele. É interessante ver que a família não foi simplesmente formada porque havia um sentimento que os obrigava manter um compromisso aprisionador, mas sim porque havia um desejo de uma relação mais livre, mas que se mantivesse apoiada num sentimento amoroso (mesmo que, em um primeiro momento, tudo isso tenha sido visto com uma certa desconfiança). Em um diálogo entre uma das mulheres de Paul e o advogado dele:

“Todas nós gostávamos muito de Morel. Eu estava apaixonada por ele.”
“Vocês não se incomodavam dele ir para cama com outra?”
“No princípio aquilo me perturbava um pouco, mas nas nossas conversas esse assunto era sempre discutido. (...) Nós éramos uma família.”

Uma das personagens mais interessante é a Joana, uma das amantes de Morel. Ela adora apanhar enquanto faz sexo e só consegue sentir prazer assim. Em uma das cenas em que ela e Paul Morel estão juntos, ela chega para ele com um chicote de cavalo e...

“ Você não vai me bater?”
“Com o chicote?”
Nossos movimentos cada vez mais violentos.
“Como é que você vai me bater com o chicote? Aqui deitada? Ou eu saio correndo e você corre atrás de mim até me encurralar num canto e então me bate, bate, bate!...”
“Não sei, como você quiser”, consegui dizer.
“Bate com a mão mesmo”, Joana pediu.
Apoiado na mão direita, dei um tapa com a esquerda no rosto de Joana. Joana fechou os olhos, o rosto crispado, não emitiu um som sequer. Dei outro tapa, agora com a mão direita, com mais força.
“Bate, bate!”
Bati com mais violência. Joana deu um gemido lancinante.
Continuei batendo sem parar.
“Me chama de puta...”
“Sua puta!”
“Mais, mais!...”
Chamei Joana de todos os nomes sujos, bati com força no seu rosto. Nossos corpos cobertos de suor. Lambi o rosto de Joana, em fogo das pancadas recebidas. Nossas bocas sorviam o suor que pingava do rosto do outro. De dentro de mim, de um abismo fundo, vinha o orgasmo, uma pressão acumulada explodindo.

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